sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

O espiral do tempo


Este tempo em espiral gerou algumas controvérsias entre os que leram o texto de abertura do PONTO. Sim, como disseram, não posso afirmar que o tempo é um espiral! Porém, não posso crer que o tempo é uma linha vertical ou horizontal. Prefiro imaginar o tempo fazendo círculos e imaginar que cada ser é uma partícula que se move, neste louco espiral, de forma desordenada. Podemos dar voltas e voltas. Perder a sensação de andar para trás, para frente, para o lado. Podemos até pensar que estamos seguindo em frente, enquanto, na verdade, continuamos no lugar de sempre. Mas este lugar já não é o mesmo. São tantas tentativas de dominar o tempo. Mas ele sempre será uma força oculta, apenas sentida nas rugas do rosto de quem presenciou um PONTO. (O tempo em espiral: http://www.xr.pro.br/Exeriana/Dinamica.html )

E o primeiro PONTO aconteceu “em local não revelado” como citou muito bem Pablo Lisboa, no site da RádioCom – Pelotas/RS. Cidade esta que concedeu as reais possibilidades para que a idéia surgisse, fosse estudada, organizada e efetivada. Porém a mesma cidade que permite o fechamento de salas de cinema, que permite o silêncio da comunidade, Que emudece a Rádio Comunitária.

O desejo do grupo não era limitar o número de pessoas. Isso ocorreu em função das condições que dispúnhamos para este lançamento. Nossos objetivos foram alcançados, os convidados apareceram com a curiosidade que a proposta exigia. Agradecemos aos amigos que prestigiaram nossos convites. E para complementar contamos com uma presença que estava fora dos planos. Fica aqui registrado o agradecimento ao proprietário do local e a equipe que faz a “máquina girar”, cuidando dos equipamentos e dando a atenção necessária para que tudo acontecesse de forma tranqüila. A inquietude ficou mesmo por conta do filme de Gaspar Noé.

Após a exibição uma roda de conversa se fez, naturalmente, pela necessidade de expressar as múltiplas leituras. A impressão que dá, é que neste média metragem, o tempo restante que falta para que o trabalho fosse um longa, se passa no imaginário do público. Todos são contaminados pelas múltiplas informações contidas no filme e submersas no imaginário, leituras tão pessoais que somente as pessoas que as fazem são capazes de expor.

O inconsciente, como bem sabemos, não é redutível a imagens, não consiste em um tesouro de imagens, mas em uma série de marcas, impressões que fixam determinados significantes. A análise do sonho, fundadora da psicanálise, bem mostra isso: o quanto a imagem onírica é construída pela linguagem, é pictograma. (Rivera, Tânia. Rev. Dep. Psicol.,UFF v.18 n.1 Niterói jan./jun. 2006)*

As cenas que chocam na primeira seqüência, escancaram as portas do inconsciente, trazendo a tona marcas e fantasias. E sobram questões suspensas que nos levam a pensar. A concepção estética, de cores e a fotografia, muito bem utilizada por Noé colaboram para as sensações que a narrativa percorre. O cuidado em levar o expectador para os registros da dor, do sangue e da carne. As situações extremas que passam os personagens conduzem à inquietude de uma história que inacabada, se realiza no imaginário. O tempo passa muito depressa. Sente-se um vazio. O cômico surge trazido pela perversão midiática da dor e da perda, da morte tão rotineiramente banalizada. Porém, este cômico-louco vem insatisfeito com o que experimenta do mercado e da sociedade. É o louco oculto, contaminado pelo cinema. “The lunatic is in my head.”(Pink Floyd: “Brain Demage”)

RIVERA coloca a loucura do cinema, em seu artigo sobre psicanálise, partindo do filme Irreversível, também de Gaspar Noé. Citando Barthes, analisa a loucura utilizada pela indústria cultural, por Noé e consumida no PONTO:

Ora, o cinema das últimas décadas parece engajado em tentar ser "louco por natureza", ao mesmo tempo em que se caracteriza como um verdadeiro construtor de "lembranças encobridoras coletivas". Por um lado, a imagem impõe-se aí com a mesma convicção perceptiva e o misterioso agenciamento com imagens ausentes que caracterizam a lembrança encobridora, e provavelmente suscita em cada expectador um movimento análogo de evocação singular de seqüências fantasmáticas. O cinema encobre, por essa vertente, o que pode haver de traumático na imagem.

No fim da conversa, percebemos que cada um realizou sua leitura no território que lhe era seguro ou incomodativo, caminhando entre um e outro, entregando-se a vertigem do espiral do tempo. A ação rápida que aconteceu no Papuera Bar para assistir o CARNE, movimentou o espaço que existia dando um novo significado ao lugar. Os que presenciram isto, tornaram-se ao fim da vivência, PARTÍCULAS PONTO. Como disse uma amiga que não pode comparecer: “Vida longa ao . ”. O Próximo está por vir... (E.A.)

*RIVERA, Tania. Cinema e pulsão: sobre "Irreversível", o trauma e a imagem. Rev. Dep. Psicol.,UFF [online]. 2006, vol. 18, no. 1 [citado 2008-02-22], pp. 71-76. Disponível em: . ISSN 0104-8023. doi: 10.1590/S0104-80232006000100006

2 comentários:

Fabrício Marcon disse...

Se o tempo é uma espiral (ou um ponto em um movimento espiralado) em uma determinada posição o observador visualisa este ponto girando ao redor de um círculo dando voltas e mais voltas nesta trajetória circular infinita. Não percebe que o ponto, além de se movimentar dessa forma, se aproxima cada vez mais. É a falsa idéia da exata repetição (a exata posição do ponto no espaço a cada ciclo) que permanece, quando o que acontece, na verdade, é que a cada volta o ponto está mais próximo (ou mais distante, se assim se quiser estabelecer - sem falar na carga de significados diferentes que cada uma das duas possibilidades pode transmitir)

pablolisboa disse...

É teimosia, mas eu acredito na descentralização da cultura. E o PONTO, de forma simples e eficaz operou esta descentralização na forma de processo inacabado de fazer cultural privilegiando a deriva e não o acabado, o pronto. Anestesia, seria a palavra mais própria para denominar os filmes e os finais dos filmes (conclusões) em sua grande maioria. CARNE atendeu a outra forma de constituir o obejto artístico: apresento indicações e voces concluem, ou enlouquecem na pira da arte.
Bem que o mundo poderia ser cheio de PONTOS...